Nesse belo discurso, Bento XVI mostra o sujeito da educação cristã como alguém que vive em íntima relação com Deus, através “da oração e da amizade pessoal com Cristo”. Além disso, mostra que a educação do jovem deve ser um convite corajoso, que interpela sua liberdade e pede-lhe uma decisão radical, e dialoga com sua inteligência, respondendo a sua sede de verdade. Educar para a fé, o seguimento e o testemunho quer dizer ajudar os nossos irmãos, ou melhor, significa ajudar-nos uns aos outros a entrar num relacionamento vivo com Cristo e com o Pai. É esta, desde o início, a tarefa fundamental da Igreja, como comunidade dos fiéis, dos discípulos e dos amigos de Jesus. A Igreja, corpo de Cristo e templo do Espírito Santo, é aquela companhia confiável em que somos gerados e educados para nos tornarmos, em Cristo, filhos e herdeiros de Deus. Nela recebemos aquele Espírito, “pelo qual chamamos: “Abbá, Pai”!” (Rm 8, 15)… Deus não está distante, tendo-se tornado “caminho”, e o próprio “caminho” veio até nós… As dificuldades atuais da educação e a tarefa da Igreja A experiência cotidiana diz-nos e todos nós o sabemos que hoje em dia educar para a fé não é uma tarefa fácil. Na realidade, hoje cada obra de educação parece tornar-se cada vez mais árdua e precária. Por este motivo, fala-se de uma grande “emergência educativa”, da dificuldade crescente que se encontra ao transmitir às novas gerações os valores-base da existência e de um reto comportamento, dificuldade esta que interpela tanto a escola como a família, e pode-se dizer todos os outros organismos que se propõem finalidades educativas. Podemos acrescentar que se trata de uma emergência inevitável: numa sociedade e numa cultura que muitas vezes fazem do relativismo o seu próprio credo… vem a faltar a luz da verdade, aliás, considera-se perigoso falar de verdade, considera-se “autoritário” fazê-lo, e assim termina-se por duvidar da bondade da vida – ser homem é um bem? viver é um bem? – e da validade dos relacionamentos e dos compromissos que constituem a vida. Então, como seria possível propor aos mais jovens e transmitir de geração em geração algo de válido e de certo, das regras de vida, um significado autêntico e finalidades convincentes para a existência humana, quer como pessoas quer como comunidade? Por isso, a educação tende amplamente a reduzir-se à transmissão de determinadas habilidades, ou capacidades de fazer, enquanto se procura anular o desejo de felicidade das novas gerações, cumulando-as de objetos de consumo e de gratificações efêmeras. Assim, tanto os pais como os professores são facilmente tentados a abdicar das tarefas educativas que lhes são próprias, e a não compreender mais nem sequer o seu papel, ou melhor, a missão que lhes foi confiada. Mas precisamente deste modo, não oferecemos aos jovens, às novas gerações, aquilo que temos o dever de lhes comunicar. Nós somos devedores no que se lhes refere, também dos verdadeiros valores que dão fundamento à vida. Mas, esta situação evidentemente não satisfaz, não pode satisfazer, porque deixa de lado a finalidade essencial da educação, que é a formação da pessoa, para torná-la capaz de viver plenamente e de oferecer a sua própria contribuição para o bem da comunidade. Por isso aumenta, em muitos lugares, a exigência de uma educação autêntica e a redescoberta da necessidade de educadores que sejam autenticamente tais. Pedem-no os pais, preocupados e muitas vezes angustiados pelo futuro dos seus próprios filhos; pedem-no numerosos professores, que vivem a triste experiência da degradação das suas escolas; pede-o a sociedade no seu conjunto, tanto na Itália como em muitas outras nações, porque vê que são postos em dúvida pela crise da educação os próprios alicerces da convivência. Num contexto semelhante, o compromisso da Igreja na educação para a fé, o seguimento e o testemunho do Senhor Jesus adquire, hoje mais do que nunca, também o valor de uma contribuição em vista de fazer com que a sociedade na qual vivemos consiga sair da crise educativa que está afligindo-a, pondo assim um limite à desconfiança e àquele estranho “ódio de si”, que parece ter-se tornado uma característica da nossa civilização. Porém, tudo isto não diminui as dificuldades que encontramos ao levarmos as crianças, os adolescentes e os jovens a encontrar-se com Jesus Cristo e a estabelecer com Ele um relacionamento duradouro e profundo. E, todavia, é precisamente nisto que consiste o desafio determinante para o futuro da fé, da Igreja e do Cristianismo, e, portanto constitui uma prioridade essencial do nosso trabalho pastoral: aproximar de Cristo e do Pai a nova geração, que vive num mundo em grande parte afastado de Deus. Queridos irmãos e irmãs, temos o dever de estar sempre conscientes de que uma obra semelhante não pode ser realizada com as nossas forças, mas somente mediante o poder do Espírito. São necessárias a luz e a graça que provêm de Deus e agem no íntimo dos corações e das consciências. Consequentemente, para a educação e a formação cristãs são decisivas antes de tudo a oração e a nossa amizade pessoal com Jesus: somente quem conhece e ama Jesus Cristo pode introduzir os irmãos num relacionamento vital com Ele… Um caminho educativo que dialoga com a razão e a liberdade Além disso, a educação, e especialmente a educação cristã, ou seja, a educação que plasma a própria vida em conformidade com o modelo de Deus que é amor (cf. 1 Jo 4, 8.16), tem necessidade daquela proximidade que é própria do amor. Sobretudo hoje, quando o isolamento e a solidão constituem uma condição difundida, à qual o ruído e o conformismo de grupo não põem um remédio real, torna-se decisivo o acompanhamento pessoal, que oferece a quem cresce a certeza de que é amado, compreendido e ouvido. De modo concreto, este acompanhamento deve levar-nos a experimentar pessoalmente o fato de que a nossa fé não é algo que pertence ao passado, mas que pode ser vivida hoje e que, vivendo-a, encontramos realmente o nosso bem. Assim, os adolescentes e os jovens podem ser ajudados a libertar-se de preconceitos difundidos e podem dar-se conta de que o estilo de vida cristão é realizável e racional, aliás, de forma absoluta, é o mais racional. Toda a comunidade cristã, nas suas numerosas articulações e componentes, é interpelada pela grande tarefa de conduzir as novas gerações ao encontro com Cristo: portanto, neste terreno devem expressar-se e manifestar-se com particular evidência a nossa comunhão com o Senhor e entre nós, a nossa disponibilidade e prontidão a trabalhar em conjunto, a “criar uma rede”, a realizar com a alma aberta e sincera todas as sinergias úteis, a começar pela contribuição preciosa das mulheres e dos homens que consagraram a sua própria vida à adoração de Deus e à intercessão em prol dos seus irmãos. Contudo é totalmente evidente que na educação e na formação da fé uma missão própria e fundamental, bem como uma responsabilidade primária, compete à família. Efetivamente, os pais são aqueles através de quem a criança que se prepara para a vida faz a primeira e decisiva experiência do amor, de um amor que na realidade não é apenas humano, mas constitui também um reflexo do amor de Deus por ele… Na medida em que os jovens crescem, aumenta neles naturalmente o desejo de autonomia pessoal, que facilmente se torna, sobretudo na adolescência, uma tomada de distância crítica da própria família. Então, revela-se particularmente importante aquela proximidade que pode ser assegurada pelo sacerdote, pela religiosa, pelo catequista ou por outros educadores capazes de tornar concreto para os jovens o rosto amigo da Igreja e o amor de Cristo. Para gerar efeitos positivos que perdurem no tempo, a nossa proximidade deve estar consciente de que o relacionamento educativo é um encontro de liberdade e que a própria educação cristã é formação para a liberdade autêntica. Com efeito, não há uma proposta educativa que não estimule uma decisão… Quando sentem que são respeitados e considerados com seriedade na sua liberdade, os adolescentes e os jovens, apesar da sua inconstância e fragilidade, não são de modo algum indisponíveis a deixar-se interpelar por propostas exigentes: aliás, sentem-se atraídos e muitas vezes fascinados por elas. E querem mostrar também a sua generosidade na dedicação aos grandes valores, que são perenes e constituem o fundamento da vida… Interpelado e muitas vezes confundido pela multiplicidade de informações e pelo contraste das idéias e das interpretações que lhe são incessantemente propostas, o jovem de hoje conserva todavia dentro de si uma grande necessidade de verdade: portanto, permanece aberto a Jesus Cristo que, como nos recorda Tertuliano (cf. De virginibus velandis, I, 1), “afirmou ser a verdade, e não a tradição”. A nossa tarefa consiste em procurar responder à exigência da verdade, colocando destemidamente a proposta da fé em confronto com a razão do nosso tempo… O trabalho educativo passa através da liberdade, mas tem também necessidade de autoridade. Por isso, especialmente quando se trata de educar para a fé, são fulcrais a figura da testemunha e o papel do testemunho. A testemunha de Cristo não transmite simplesmente informações, mas compromete-se de maneira pessoal na verdade que propõe e, através da sua própria vida, torna-se um ponto de referência confiável. Todavia, não se inspira em si mesma, mas em Alguém que é infinitamente maior do que ela, em Quem confiou e de Quem experimentou a bondade fidedigna. Portanto, o educador autenticamente cristão é uma testemunha que encontra o seu próprio modelo em Jesus Cristo, a Testemunha do Pai que nada dizia por si mesma, mas falava como o Pai lhe tinha ensinado (cf. Jo 8, 28). Estimados irmãos e irmãs, este relacionamento com Cristo e com o Pai constitui, para cada um de nós, a condição fundamental para nos tornarmos eficazes educadores da fé… |